Desigualdades Afetivas de Raízes Ancestrais: Uma Análise de Imagens e Discursos acerca de Amas de Leite e Babás na Formação do Brasil

Autores

Agências de fomento

Palavras-chave:

Babás, cinema documentário brasileiro, afetividade

Resumo

Por meio do excerto “Quase todo o Brasil cabe nessa foto” (ALENCASTRO, 1997, p. 440), Consuelo Lins inicia o documentário Babás (2010), valendo-se da iconografia do século XIX e seus resquícios na sociedade brasileira contemporânea. A partir de sua própria experiência, empreende dialogismos com a História em suas origens coloniais e escravocratas dispostas a naturalizar e demarcar estruturas sociais excludentes ancoradas em raízes ancestrais de desigualdades afetivas. Ao se valer de uma narração off e de materiais de arquivo – fotografias, jornais, vídeos pessoais e de outros –, a cineasta busca reconstruir uma imagem de país capaz de ultrapassar as fronteiras do tempo para erigir reflexões cada vez mais urgentes dada a atual conjuntura social que desconsidera os corpos e subjetividades responsáveis pela sustentação do país, como babás e empregadas domésticas, cujas ascendências remetem às amas de leite, às mucamas e às mulheres escravizadas. Ao decidir retratar e registrar empregadas próximas, Lins passa a fomentar um exercício reflexivo afeito ao passado do país e à manutenção das relações de classe que, a partir da câmera, denotam claras assimetrias de poder (FOUCAULT, 2008). Como um lugar social que alude a lugares de memórias, as babás reverberam-se em alteridades que ressignificam identidades silenciadas na formação do Brasil envolto em lacunas interseccionais (GONZÁLEZ, 1984). Desse modo, o curta-metragem parece desnudar traumas históricos continuamente revividos pela sociedade brasileira em sua formação pautada pela mistura das relações sociais e pela pretensa troca de afetividades para perpetuação de violências raciais e simbólicas.

Biografia do Autor

Meire Oliveira Silva, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP).

Áreas de Interesse:

Teoria Literária e Literatura Comparada. Estudos Comparados de Cinema e Literatura. Interartes. Intermidialidades.

Minibio:

Doutora e Mestre em Teoria Literária e Literatura Comparada pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas pela Universidade de São Paulo (FFLCH-USP). Autora de Liturgia da pedra: negro amor de rendas brancas (2018) e O cinema-poesia de Joaquim Pedro de Andrade: passos da paixão mineira (2016), e também tradutora de textos literários e acadêmicos das línguas inglesa, francesa e espanhola. Desenvolve pesquisas em História do documentário brasileiro e Teoria do cinema documentário. 

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Publicado

02-08-2021

Como Citar

OLIVEIRA SILVA, M. Desigualdades Afetivas de Raízes Ancestrais: Uma Análise de Imagens e Discursos acerca de Amas de Leite e Babás na Formação do Brasil. Línguas & Letras, [S. l.], v. 22, n. 52, 2021. Disponível em: https://e-revista.unioeste.br/index.php/linguaseletras/article/view/27171. Acesso em: 19 abr. 2024.

Edição

Seção

DOSSIÊ PARTE II - Abordagens críticas (pós) decoloniais na literatura, no ensino e na cultura