Equiparação entre nazismo e comunismo: usos do passado e representações falsas no Brasil contemporâneo

Autores

  • Michel Ehrlich UFRGS

DOI:

https://doi.org/10.36449/rth.v28i1.31614

Palavras-chave:

usos do passado, direitas brasileiras, totalitarismo

Resumo

Este artigo analisa dois projetos de lei apresentados pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro nos quais é traçada uma equiparação entre nazismo e comunismo como igualmente criminosos. Ao realizar essa análise proponho ler os projetos de lei como tentativas de impulsionar um debate social, para além da aprovação ou não da lei. Tendo isso em vista, em um primeiro momento é realizada uma discussão da tese de Bolsonaro a luz da historiografia. Em um segundo momento, são discutidos os procedimentos discursivos empregados e a que interesses a narrativa da equivalência entre nazismo e comunismo serve. Conclui-se que ela pode servir ao menos a quatro interesses distintos, mas não mutuamente excludentes: demonização do comunismo; apologia à ditadura civil-militar; normalização do nazismo e relativização do Holocausto; apresentação do neoliberalismo como a única alternativa.

Referências

ABAL, Felipe Cittolin. Um risco para a História: normalização, revisionismo e reacionarismo. Revista Hydra. v. 4, n. 7, p. 50-67, 2019.

ALESSI, Gil. Secretário da Cultura de Bolsonaro imita fala de nazista Goebbels e é demitido. El País Brasil, 2020. Disponível em https://brasil.elpais.com/brasil/2020-01-17/secretario-da-cultura-de-bolsonaro-imita-discurso-de-nazista-goebbels-e-revolta-presidentes-da-camara-e-do-stf.html . Acesso em 09/11/2022.

ALEXANDER, Jeffrey. Trauma: A social theory. Malden: Polity Press, 2012.

AVILA, Arthur Lima de. Qual passado escolher? Uma discussão sobre o negacionismo histórico e o pluralismo historiográfico. Revista Brasileira de História, v. 41, n. 87, pp. 161-184, 2021.

BAUER, Caroline Silveira. Qual o papel da história pública frente ao revisionismo histórico? in MAUAD, Ana Maria; SANTHIAGO, Ricardo; BORGES, Viviane Trindade. Que história pública queremos? What public history do we want?. São Paulo: Letra e Voz, 2018.

BAUER, Caroline Silveira. Usos do passado da ditadura brasileira em manifestações públicas de Jair Bolsonaro. In: KLEM, Bruna, PEREIRA, Mateus, ARAÚJO, Valdei (orgs.). Do Fake ao Fato: des(atualizando) Bolsonaro. Vitória: Milfontes, p. 173-193, 2020.

BENJAMIN, Walter. O capitalismo como religião. In: BENJAMIN, Walter. O capitalismo como religião. São Paulo: Boitempo, 2013 [1921].

BOBBIO, Norberto. Direita e esquerda: razões e significados de uma distinção política. São Paulo: Editora da Unesp, 1995.

BRASIL. Projeto de lei 4425/2020. Altera a redação da Lei nº 7.170, de 14 de Dezembro de 1983 e da Lei nº Nº 9.394, de 20 de Dezembro de 1996, criminalizando a apologia ao nazismo e comunismo, e dá outras providências. Câmara dos deputados. 2020.

BRASIL. Projeto de lei 5358/2016. Altera a redação da Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 e da Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016, para criminalizar a apologia ao comunismo. Câmara dos deputados. 2016.

BROWN, Wendy. Nas ruínas do neoliberalismo. São Paulo: Editora Filosófica Politéia, 2019.

CHAMAYOU, Grégoire. A sociedade ingovernável: uma genealogia do liberalismo autoritário. São Paulo: Ubu Editora, 2020.

DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016.

ESTADÃO CONTEÚDO. General Heleno defende direitos humanos para 'humanos direitos'. Estado de Minas, 2018. Disponível em https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2018/11/01/interna_politica,1002158/general-heleno-defende-direitos-humanos-para-humanos-direitos.shtml . Acesso em 09/11/2022.

ESTADO DE MINAS. Assessor de Bolsonaro faz gesto considerado supremacista em audiência. Estado de Minas, 2021. Disponível em https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2021/03/24/interna_politica,1250265/assessor-de-bolsonaro-faz-gesto-considerado-supremacista-em-audiencia.shtml . Aceso em 09/11/2022.

FOUCAULT, Michel. Nascimento da Biopolítica. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar, esquecer, escrever. São Paulo: Editora 34, 2006.

GEYER, Michael; FITZPATRICK, Sheila. Introduction: After Totalitarianism – Stalinismand Nazism Compared. In: GEYER, Michael; FITZPATRICK, Sheila (orgs.). Beyond Totalitarianism: Stalinism and Nazizm Compared. Cambridge: Cambridge University Press, 2009.

GHODSEE, Kristen. Tale of “Two Totalitarianisms”: The Crisis of Capitalism and the Historical Memory of Communism. History of the Present: A Journal of Critical History, v. 4, n. 2, pp. 115-142, 2014.

HAYEK, Friedrich. O caminho da servidão. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010 [1944].

HERF, Jeffrey. O modernismo reacionário: tecnologia, cultura e política na República de Weimar e no Terceiro Reich. Campinas: Editora da Unicamp, 1993.

JAY, Martin. Dialectic of Counter-Enlightenment: The Frankfurt School as Scape goat of the Lunatic Fringe. In: JAY, Martin. Splinters in your eye: Frankfurt School Provocations. New York: Verso, 2020.

KERSHAW, Ian. The Nazi Dictatorship: Problems and Perspectives of Interpretation. New York: Bloomsbury, 2015.

LEVY, Daniel; SZNAIDER, Natan. The Institutionalization of Cosmopolitan Morality: The Holocaust and Human Rights. Journal of Human Rights, v. 3, n. 2, pp. 143-157, 2004.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido comunista. São Paulo: Edipro, 2015 [1848].

MENESES, Sônia. Os vendedores de verdades: o dizer verdadeiro e a sedução negacionista na cena pública como problema para o jornalismo e a história (2010-2020). Revista Brasileira de História, v. 41, n. 87, pp. 61-87, 2021.

MOTTA, Rodrigo Patto Sá. Comunismo e anticomunismo sob o olhar da polícia política. Locus: revista de história. v. 30, n. 2, p. 17-27, 2010.

NUNES, Rodrigo. Do Transe à Vertigem: ensaios sobre o bolsonarismo e um mundo em transição. São Paulo: Ubu, 2022

OHARA, João. Ética, escrita e leitura da História: os problemas da expectativa e da confiança. Revista de História, n.178, pp. 1-28, 2019.

PAXTON, Robert. A anatomia do fascismo. São Paulo: Paz e Terra, 2007.

PEREIRA, Mateus Henrique de Faria. Nova direita? Guerras de memória em tempos de Comissão da Verdade (2012-2014). Varia História, v. 31, n. 57, pp. 863-902, 2015.

PINTO, Céli Regina Jardim. A trajetória discursiva das manifestações de rua no Brasil (2013-2015). Lua Nova: revista de cultura e política. n. 100, p. 119-153, 2017.

RAND, Ayn. The new fascism: rule by consensus. In: RAND, Ayn. Capitalism: The Unknown Ideal. New York: New American Library, 1970.

ROCHA, Camila. Menos Marx, mais Mises: o liberalismo e a nova direita no Brasil. São Paulo: Todavia, 2021.

ROTHBERG, Michael. Lived multidirectionality: “Historikerstreit 2.0” and the politics of Holocaust memory. Memory Studies, v. 15, n. 6, pp. 1316-1329, 2022.

SUSSAI, Matheus Henrique Marques. Os usos da ideia de “nazismo” difundida pelo MBL – Movimento Brasil Livre no Facebook (2017). Dissertação (mestrado em História). Universidade Estadual de Londrina, 193 f, 2019.

TRAVERSO, Enzo. El Totalitarismo: Historia de un debate. Buenos Aires: Eudeba, 2001.

TRAVERSO, Enzo. El totalitarismo: usos y abusos de un concepto. In: Las escalas del pasado: IV Congreso de Historia Local de Aragón (Barbastro, 3-5 de julio de 2003). Instituto de Estudios Altoaragoneses, p. 99-110, 2005.

TRAVERSO, Enzo. La historia como campo de batalla: interpretar las violencias del siglo XX. Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica, 2012.

UOL. Monark defende existência de partido nazista dentro da lei; Tabata rebate. UOL, 2022. Disponível em https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2022/02/08/podcaster-monark-partido-nazista.htm?cmpid . Acesso em: 09/11/2022.

VETTORASSI, Andréa; OLIVERIA, Dijaci David de; BENEVIDES, Rubens de Freitas. Direitos humanos no Brasil: os ataques às humanidades no governo Bolsonaro. Humanidades & Inovação, v. 7, n. 20, p. 400-417, 2020.

VIDAL-NAQUET, Pierre. Os assassinos da memória: um Eichmann de papel e outros ensaios sobre o revisionismo. Campinas: Papirus, 1988.

VINYES RIBAS, Ricard. Los usos públicos delpasadoen Europa: hacia una memoria sincrética. Anos 90. v. 22, n. 42, p. 21-51, 2015.

VON MISES, Ludwig. Liberalismo segundo a tradição clássica. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010.

VON MISES, Ludwig. Omnipotent Government: the rise of the total state and the total war. Auburn: Mises Institute, 2010 [1944]

WILDT, Michael. Volksgeminschaft: A Modern Perspective on National Socialist Society.In: STEBER, Martina; GOTTO, Bernhard. Visions of Community in Nazi Germany: Social Engineering and Private Lives. Oxford: Oxford Universisty Press, 2014.

Downloads

Publicado

10-07-2024

Como Citar

EHRLICH, M. Equiparação entre nazismo e comunismo: usos do passado e representações falsas no Brasil contemporâneo. Tempos Históricos, [S. l.], v. 28, n. 1, p. 5–36, 2024. DOI: 10.36449/rth.v28i1.31614. Disponível em: https://e-revista.unioeste.br/index.php/temposhistoricos/article/view/31614. Acesso em: 13 out. 2024.

Edição

Seção

Artigos