Equiparação entre nazismo e comunismo: usos do passado e representações falsas no Brasil contemporâneo
DOI:
https://doi.org/10.36449/rth.v28i1.31614Palavras-chave:
usos do passado, direitas brasileiras, totalitarismoResumo
Este artigo analisa dois projetos de lei apresentados pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro nos quais é traçada uma equiparação entre nazismo e comunismo como igualmente criminosos. Ao realizar essa análise proponho ler os projetos de lei como tentativas de impulsionar um debate social, para além da aprovação ou não da lei. Tendo isso em vista, em um primeiro momento é realizada uma discussão da tese de Bolsonaro a luz da historiografia. Em um segundo momento, são discutidos os procedimentos discursivos empregados e a que interesses a narrativa da equivalência entre nazismo e comunismo serve. Conclui-se que ela pode servir ao menos a quatro interesses distintos, mas não mutuamente excludentes: demonização do comunismo; apologia à ditadura civil-militar; normalização do nazismo e relativização do Holocausto; apresentação do neoliberalismo como a única alternativa.
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